terça-feira, 18 de maio de 2010

Clownie


Um espelho, uma bola vermelha, maquilhagem. Olha-se no espelho e vê aquele fato, tão ridículo ao ponto do cómico, tão companheiro de toda a vida, ao ponto de lhe tomar carinho. Um fato azul com bolinhas vermelhas e pompons amarelos, igual ao que a mãe lhe fez quando era pequeno, foi essa a ultima recordação deixada pela mãe, a quem o chão deixou de estar por debaixo dos pés e passou a ficar por cima da cabeça.
Houve quem dissesse que o rapaz não ficou bem depois do sucedido á mãe, houve quem dissesse que o rapaz ficou apegado ao fato, houve quem dissesse que o rapaz apenas descobriu que gostava de ser palhaço, certo é que a partir desse dia não mais quis largar o fato. Até ao dia em que (de acordo com as leis natureza) já não coube nele. Hoje já tem um guarda roupa cheio de fatos azuis, com bolinhas vermelhas e pompons amarelos... Mas aquele é o melhor e mais bonito, sempre será. Hei-nos de novo com o nosso herói, sim, não digam a ninguém, digo-vos isto em segredo, mas na realidade ele é um, um pouco diferente dos outros heróis, mas ele é, tenho a certeza...
Como que acorda de um sonho dócil e espanta-se ao ver a sua face branca e com as pinturas habituais, os gestos, os rituais, já se tornaram tão mecânicos que já nem os nota. Falta apenas o toque final, pega na delicada batatinha vermelha e coloca-a no nariz.
Está pronto para o espectáculo (ou será vida...).
Sai do seu pequeno mundo e começa por fazer equilibrismo sobre o fio que separa a realidade da fantasia, o publico aplaude este espectáculo insanamente, mas de entre todos ele repara numa menina que está sentada quietinha e cabisbaixa no seu lugar. Ele hesitou, mas dirigiu-se a ela e estendeu-lhe a mão, mas ela ficou apenas a olhá-lo e aqueles olhos profundos de tristeza fizeram-nos lembrar um olhar que ele já tinha visto no espelho há muitos anos atrás quando ainda era menino. Os olhos dele falaram-lhe e ela deu-lhe então a mão e seguiu-o chegados ao centro do pequeno mundo do palhaço, ele segurou um dos pompons e puxou-o do fato. Abriu a mão da menina e deixou-o lá como se fosse o seu bem mais precioso. Ela olhou-o, olhou o pompom e metendo a mão no bolso, retirou de lá uma estrela .
E então, estendendo-lhe o braço que segurava a estrela disse-lhe:
“A minha mãe disse que um dia encontraria uma pessoa especial. Tu és uma pessoa especial?”
Sim, sem dúvida sou uma pessoa especial (disse ao aceitar a estrela), sou a única pessoa que tem uma estrela tua.
E saíram os dois de mãos dadas, segurando uma estrela e um pompom...

Não vos disse que ele era um herói?



TENSHI
Grândola
Algures no passado

A PONTE PARA A ETERNIDADE


Deixou pousar por um momento os pensamentos e abriu os olhos demoradamente, e da escuridão das suas pálpebras passava agora a percepcionar o castanho-esverdeado que subitamente, como que por encanto, aparecia à sua frente. A retina expandiu-se para abarcar todo o objecto da visão, e sorriu. O que sentiu nesse momento até a Vénus lhe custará descrever. Imagine-se a coisa que mais se quer, que nos faz sentir bem e felizes, que mais se ama... Foi isso que ele viu, (não sendo assim de admirar o seu sorriso). E docilmente uma mão tocou-o no rosto, ele, acompanhava cada movimento da mão, como que com medo que aquele toque cessasse. E aquela mão dotada de um enorme carinho percorreu-lhe o corpo até chegar à sua. Ai então as duas mãos, geralmente banalizadas, firmaram uma comunhão entre dois espíritos que se mostrava perfeita, e assim se mantiveram durante muito tempo... Até que um dia, enquanto passeavam num jardim, orgulhosos e felizes por as suas mãos se manterem juntas, aconteceu o inesperado...Repentinamente notaram que entre eles passava uma senhora com um carrinho de bebé, cada um tinha ido pelo seu lado e o medo apoderou-se deles, iriam as suas mãos separar-se?
Olharam a medo um para o outro e (como que) sem controlarem os próprios corpos, os seus braços levantaram-se, e a senhora passou empurrando o carrinho com o seu bebé...
E a imagem que ficou foi a de uma ponte, para eles, uma ponte para a eternidade...
 
 
 
TENSHI
Grândola
26.05.2000
04:10:03

Chains of Aras


Um Anjo vivia no palácio dos Anjos e um dia visitou o Reino da Terra, embrenhava-se nos bosques, voava com os pássaros e encharcava-se nos rios mais límpidos como se fosse apenas de luar que ele se encharcava .Mas de repente hesitou, e o mundo hesitou com ele, modificado para sempre pela pausa.
Ironicamente era ali na terra que ele acabara de encontrar o seu Anjo, não era um Anjo de verdade, mas um ser humano tão belo que ele se atrevia a chamar-lhe Anjo. Voou até junto dela e começou a voar e rodopiar à sua volta que até parecia um fogo-fátuo tonto. Sim, definitivamente mesmo entre os Anjos ela era uma deusa.
De imediato voltou ao Palácio e pediu para falar com o Príncipe, este disse-lhe que havia uma maneira de ele se juntar a ela, ele teria de encontrar as Correntes de Aras, mas logo o preveniu que se o tentasse e não o conseguisse até à meia noite do dia seguinte perderia as suas asas e seria enviado para o silencioso mundo de desfeitos sonhos.
Onde estão as correntes de aras? _perguntou o Anjo.
Estão onde as queres encontrar. _respondeu o supremo.
Mas o que são as correntes de aras? _insistiu.
São o que mais desejas no mundo, é aquilo que te pode acorrentar às terra e à tua deusa, mais não posso dizer... Boa sorte se o tentares.
Sem hesitar respondeu: Sim hei-de as encontrar.
E partiu... Procurou, procurou, percorreu todo o Reino da Terra, mas não encontrou nada que se parecesse com aquele estranho artefacto que se chamava Correntes de Aras e então já desesperado voou até ela. Dormia com uma paz que dava prazer só ficar a olha-la, mas era quase hora, e então, notou algo diferente: viu a mulher, não o anjo, não a deusa, mas a mulher que ela era, e beijou-a.
Ela acordou suavemente, olhou-o como se o conhecesse de longínquos tempos e disse: Olá Amor!
E foi essa palavra que o despertou: O Amor. Claro, era nela que ele queria encontrar o amor e era o amor que o mantinha preso a ela.
Sim, as Correntes de Aras eram simplesmente o Amor...



TENSHI
Grândola
Algures no passado